ADMIRÁVEL MUNDO NOVO? SIM!
Frank e o Robô se passa num futuro próximo onde em nossa realidade cotidiana convivemos ao lado de robôs com um elevado poder de interação com humanos. O ator Frank Langella é Frank, um velho genioso e solitário cujos filhos estão distantes e pensando em interná-lo, já que, o pai devido a idade encontra dificuldade em viver sozinho. Como última tentativa antes da internação Hunter seu filho lhe presenteia com um robô para auxilia-lo nas mais diversas tarefas e assim cuidar de sua saúde.
Observamos o mal estar do personagem com aquela geringonça a lhe perseguir, juntando ao fato da biblioteca que ele frequenta assiduamente estar passando por um processo de modernização. Lá também um robô vai substituir Jennifer (Susan Sarandon) no atendimento aos clientes. Tudo isso parece a introdução de um discurso puritano e ingênuo, neste ponto o filme de Jake Schreier parece caminhar para o lugar comum, clichês condenando a tecnologia que atropela as coisas simples da vida etc, etc. No entanto, esse contexto; “confrontos” de novo e velho, tecnológico e tradicional que o longa vai mostrar é apenas um pretexto para a história que realmente interessa; a improvável amizade entre Frank e o Robô.
É nesse momento que a “revira-volta” acontece. Pois aqui há outra proposta de discussão: Quão aptos, quão dispostos estão os homens para conviver e se doar um pelos outros? Dessa forma o longa volta a despertar interesse pois a crítica (se é que há uma) não é direcionada às máquinas ou à tecnologia que distancia as pessoas e sim para as próprias pessoas que se deixam afastar por “n” motivos.

Em seu filme de estréia como diretor, Jake Schreier mostra-se bastante a vontade a frente de estrelas como Susan Sarandon e Liv Tyler, que aqui não passam de coadjuvantes. O diretor mantém cada um no seu respectivo lugar sem alongar determinado papel somente pelo fato de um grande nome estar por trás dele. O grande nome no longa é o de Frank Lagella, que neste projeto bem menor volta a ter grande atuação aja vista seu ótimo trabalho em Frost/Nixon (2008). Frank percorre com naturalidade as contradições de seu personagem glutão, ignorante e esperto, o popular “come quieto” que até então não se interessava por mais nada ao seu redor.
Por fim, atuações, direção, temas e discussões já citadas no parágrafo acima são tratadas sem grandes enfeites ou disfarces. Longe também dos clichês que outrora se temia. Boa dose de humor e drama numa mesma receita que aliás tirando robôs quase humanos, é a mesma receita de cada um dos nossos dias…
Lançado em 2012, “Frank e o Robô” foi premiado com o troféu Alfred P. Sloan no Sundance Filme Festival 2012.
Originalmente publicado no O Cinemista
Miles Raymond (Paul Giamatti) desperta de forma intranquila de seu sono. Alguém liga em seu telefone. Ele está atrasado para aquele compromisso. Faz rapidamente a mala, passa em uma loja de conveniência e compra o jornal do dia. Toma um café expresso e pede um croissant de espinafre. Neste inicio de filme podemos perceber que Miles é um personagem no mínimo excêntrico e isso se confirmará ao longo da história mas é na riqueza, ou melhor, na sutileza de cada detalhe que Sideways, filme do diretor Alexander Payne, se mostrará interessante.

Já em seu carro, Miles vai à casa de seu amigo Jack (Thomas Haden Church), os dois farão uma viagem de uma semana pelas vinícolas do Vale de Santa Inez, na California. Será a viagem de despedida de solteiro de Jack, que Miles, um aficionado por vinhos e escritor frustrado, planejou. Porém as reais expectativas de Jack vão muito além de vinhos, golf e papo cabeça com o amigo. Essa diferença de valores ou planos fará com que descobertas, conflitos, dramas e alguns momentos de graça perambulem entre os dois. Classificado como Comédia-dramatica, talvez Sideways esteja mais para o drama do que para a comédia, porém com mais uma rica interpretação de Giamatti o filme mostra-se muito maior do que qualquer denominação rasteira pode ofertar.


Não seria exagero ou engano comparar e até mesmo confundir Miles Raymond com um personagem de Wood Allen, intelectual, escritor em crise, depressivo, problemático, tímido e atrapalhado. Miles está preso a um passado recente, com dificuldades para aceitar o divorcio de dois anos atrás. A base de remédios e terapias ineficazes segue buscando e ao mesmo tempo evitando encontrar uma nova pessoa, na verdade incapaz de enxerga-la ainda que esteja bem a sua frente.

A relação dos amigos Miles e Jack também é bastante interessante, pois ainda que amigos de longa data os dois não possuem nada em comum, são exatas contraposições. Enquanto Jack um ator de qualidade duvidosa é sempre reconhecido por fãs etc. O trabalho de Miles jamais é levado a sério. Editoras o recusam mesmo reconhecendo sua qualidade, porém como é dito em certo momento: É um daqueles bons livros que não encontra quem o publique. Enquanto Miles é um intelectual, profundo conhecedor e apreciador de vinhos e momentos introspectivos, Jack é superficial em seus conhecimentos e princípios, um aventureiro, simpático mas fútil.

O roteiro escrito e adaptado pelo próprio Alexander é inspirado no romance homônimo de Rex Pickett e a direção é de Alexander Payne de “Os Descendentes” e “Confissões de Schmidt” . Mais o destaque técnico de Sideways fica com a fotografia quase a todo instante pode se perceber na composição das cenas a luz e os planos muito bem construídos, como se de fato estivesse sendo construído um retrato. Um tom “amarelado” e belíssimas locações dão a película maior dramaticidade.


Com orçamento de 18 milhões, Sideways foi indicado a cinco Ocars tendo vencido o de melhor roteiro adaptado em 2005.

Originalmente publicado no O Cinemista


Famoso inicialmente por suas charges no jornal LANCE, com temas voltados principalmente para o mundo do Futebol, Gustavo Duarte já se mostrava diferenciado, não só pelo traço mas também por um fino e poderoso poder de captação dos temas além de uma incrivel capacidade de sintetizar, resumir os assuntos em suas ilustrações.

Monstros lançado pela Cia das Letras em 2012 e Có e Birds também lançado pela Cia em 2014, são os projetos autorais que Gustavo Duarte desenvolveu e continua desenvolvendo. Nesses trabalhos podemos verificar ainda mais toda a sua capacitade como ilustrador e também como um grande contador de histórias. 



Nos dois livros não existem palavras, diálogos ou "balõezinhos", é pela desenho, pelo recorte e pela carga dramática (mesmo sendo tão engraçado) de cada quadrinho que Gustavo costura sua história. Em Monstros, a cidade de Santos é invadida por seres gigantescos que acabarão com toda a cidade, porém essa mudança de rotina afeta o trabalho de Pinô, um simpático senhor dono de um bar. Com a invasão dos monstrengos seus clientes "simplesmente" desapareceram. Pinô apanha sua bolsa e sai pela cidade com um plano para resolver o problema.



Em Có e Birds temos duas histórias, em Có, um fazendeiro tem suas terras invadidas por Ets. Já Birds é a narrativa de dois companheiros de trabalho que recebem uma indigesta visita no escritório, a Morte... Esses dois amigos vale lembrar são dois pássaros.


 Os argumentos de Gustavo são sempre inusitados, recheados de muito humor e alguma crueldade, um grande contador de histórias mesmo se "limitando" apenas aos desenhos podemos sentir a música, a trilha sonora, os sons e vozes dos personagens. O traço do autor possui muitos detalhes mas sempre composto de uma forma bastante limpa e normalmente em duas cores.

Mas não só de literatura e quadrinhos vive o seu trabalho, podemos perceber uma forte influencia do cinema, nos cortes e edições das histórias tornam a experiência de "Ler" Gustavo Duarte ainda mais prazerosa.



Neste link muitos trabalhos do ilustrador podem ser conferidos e aqui, página do autor no site da Cia das Letras


Houve um tempo que desenhos eram somente para crianças, histórias ingênuas, personagens caricatos e músicas… Muitas músicas entre uma cena e outra. Mais tarde os produtores perceberam que ao fazer uma animação para toda a família, diminuindo cenas intermináveis de canções e com personagens mais complexos e divertidos, o sucesso seriam bem maior arrastando para os cinemas não só as criancinhas, mas os pais delas, irmãos mais velhos e até mesmo cinéfilos de carterinha que aguardam ansiosos tanto pelo novo filme de Almodovar quanto pela próximo lançamento da Pixar.

Assim, neste cenário o longa de animação “A Pequena Loja de Suicídios” mistura todas essas tendências sem abrir mão de longas canções caminhando no viés de tudo para ser um filme familiar mesmo tratando de um tema tão difícil.

Dirigido pelo francês Patrice Leconte numa co-produção de Bélgica, Canadá e França, o longa “A Pequena Loja de Suicídios” conta a história de uma cidade onde todos os moradores vivem como moribundos, tristes, sempre pensando na morte e principalmente no suicídio tendo esse como a única solução para suas vidas. Entre prédios, casas, ruas e comércios, uma pequena loja é a principal atração para esses infelizes. Trata-se de uma pequena loja especializada em artigos para o suicídio, ali todo tipo de produto para essa finalidade é encontrado. Cordas, armas, facas, venenos e muitos outros produtos. Administrada pelos Tuvache, prestam um serviço especializado e profissional com o lema: Morte ou reebolso. Mishima, o patriarca, é o principal responsável pela loja, ajudado pela mulher Lucrèce e os dois filhos mais novos – também obcecados pela morte – Marilyn e Vicent.


Tudo parece tranquilo, sob controle. Os clientes jamais voltam para reclamar dos serviços prestados pelos Tuvache e, como um total paradoxo à rotina da família, a vida segue. Lucrèce está grávida e dá a luz ao pequeno e sorridente Alain. É quando toda a confusão tem início. Alain sorri, canta, brinca, elogia e agrada seus familiares, para o espanto e desespero de seus pais, totalmente avessos a esse comportamento. Inconformado com o meio em que vive o garoto junto de amigos traça um grandioso plano para mudar toda a rotina de sua família e de todos daquela triste cidade.

A Pequena Loja de Suicídios trata de um tema bastante difícil e não o esconde em momento algum, no entanto, a habilidade de seus criadores o torna um longa divertido, agradável e porque não dizer inspirador. Os traços dos personagens e cenários são pesados e belíssimos, assim como as cores e todo o clima que cerca cada cena. O roteiro conta com diálogos inteligentíssimos e engraçados assim como as belas canções que compõe o longa. Sim, essa parece ser a principal característica da animação. Aqui as canções não são aquele momento em que queremos pular para a próxima cena, ao contrário, é o respiro e o que desperta, renova a atenção para a história e parece quase impossível não entrar no embalo, que mesmo em francês possuí um ritmo contagiante.

Assim num constante paradoxo o pequeno Alain segue sua missão de mudar para melhor a vida de seus parentes, mostrando-lhes o lado bom da vida, sendo que isso pode também representar a falência dos negócios da família. Ainda neste sentido, o diretor acerta em cheio na dose de criatividade, diversão e inteligência com que dirige a história. De forma até despretensiosa, ele detecta um problema crônico dos grandes centros urbanos e da mesma forma aponta para uma solução, cantando… C’est la vie.


Originalmente publicado no O Cinemista