Um Poema Perdido
















Eu percorro o caminho de um poema perdido... 
Percorro o caminho de um poema primeiro perdido e com o tempo da perdição, da distancia, esquecido. Percorro com a angústia de quem perdeu o mapa de um tesouro, ou a pressa e a esperança dos pelotões que voltam em busca de sobreviventes. Enquanto na memória, agoniza uma lembrança, cada vez menor, cada vez mais distante e fraca.

                Em contra partida uma falsa memória vai construindo, reconstruindo um falso poema, um outro poema que jamais será aquele, ainda que eu me lembre e recoloque cada métrica, cada palavra naquele que fora seu devido lugar. Mas este lugar não existe mais, este espaço vai sendo preenchido em outra folha, em outro arquivo tentando dizer o que já foi dito, mas diz algo parecido, diz outra coisa.

                Quão controversos e esguios são os caminhos de um poema, pois aquele poema depois de pronto é outro poema que já nem pertence a alguém, que é dedicado a todas as musas, contra todos os opressores e descreve todos os hipócritas, e tentar “re-percorre-lo” é percorrer caminho novo, caminho algum, sem mais arquitetura, sem traços ou cálculos que nos levariam ao mesmo número. Mas aquele poema perdido nunca mais será escrito, e a vã procura por um inútil oficio de arqueólogo de palavras, jamais vencerá a palavra dispersa, distribuída. E fica, pois essa anti-matéria a perda, da perda, de que são feito todos os poemas...

Ygor Moretti
Literatura de Esbarrão
ou Literatura de Copista

Bartleby e Cia - de Enrique Vila Matas

Para contar um pouco da história de Bartleby e Cia de Vila Matas é preciso contar um pouco da história de Bartleby o escrivão de Herman Melville, que conta a enigmática história do escrivão Bartleby que passou a viver da negação de tudo, e a tudo que surgia, que era proposto ou ordenado ele respondia: Prefiro não fazer.
A partir disso eis que surge entre os literatos a sindrome de bartleby, o mal endemico a pulsão negativa que leva escritores ao absoluto silencio, a total negação da própria literatura ou de futuros projetos. E é isso que Bartleby e Cia nos conta, um autor que sofre da sindrome resolve escrever um romance feito de notas após 25 anos de silencio, e nos divide casos de grandes escritores ou escritores menores, totalmente desconhecidos que foram vitimas do mal do silêncio.

 "...Nunca tive sorte com as mulheres, suporto com resignação uma penosa concurda, meus parentes mais próximos estão todos mortos, sou um pobre solitário que trabalha em um escritório pavoroso. De resto, sou feliz. Hoje mais do que nunca porque começo - 8 de julho de 1999 - este diário que será ao mesmo tempo um caderno de notas de rodapé comentando um texto invisível e, espero, demonstrando minha destreza como rastreador de bartlebys..."




















"...Talvez fosse necessário dizer algo mais sobre isso, sobre o não escrever. Muita gente me pergunta isso, eu me pergunto. E perguntar-me por que não escrevo inevitavelmente desemboca em outra inquisição muito mais inquietante por que escrevi? Afinal de contas, o normal é ler. Minhas respostas favoritas são duas. Uma, que minha poesia consistiu - sem que eu soubesse - em uma tentativa de inventar uma identidade para mim, inventada e assumida, já não tenho vontade de colocar-me inteiro em cada poema, que era o que me apaixonava quando os escrevia. Outra, que tudo foi um equivoco: eu pensava que queria ser poeta, mas no fundo queria ser poema..."

O escrito catalão Enrique Vila Matas















Autor: Enrique Vila-Matas
Ilustração: Josely Vianna Baptista
Tradução: Josely Vianna Baptista, Maria Carolina de Araújo
Idioma: Português